Mário
Soares não vai estar presente nas comemorações do 25 de Abril deste ano. Ao
arrepio de todas as criticas que já li e de outros comentários a verberar quem
criticou a posição do político, devo dizer que Mário Soares tem legitimidade,
como cidadão, de participar naquilo que lhe aprouver e onde lhe convier. Como ex-Presidente
e ex-Primeiro-Ministro, que continua a viver, de forma sibarita, à custa do
erário público, que, para além de lhe pagar as mordomias, ainda lhe salda as
multas por desvarios de velocidade e outros pecados mais ou menos confessáveis,
Mário Soares já não pode, por capricho, eximir-se a certas presenças. Noblesse
oblige.
Mário
Soares pode não gostar deste Governo. Muita gente boa não gosta! Mas, que me
conste, as comemorações nada têm a ver com o Governo, decorrem na casa de
democracia onde se sentam todas as correntes políticas portuguesas. Por
respeito a socialistas, comunistas e outros esquerdistas, Mário Soares, não
fosse por mais nada, deveria respeitar quem ainda acredita nele como um dos
grandes barões da democracia.
A mim, Mário
Soares pouco me diz ideologicamente. Talvez porque ele enterrou – ou guardou na
gaveta - todas as ideologias que nos vendeu durante a longa noite. Mas respeito
a disponibilidade democrática que emprestou (parece que, de facto,
nunca deu, no sentido bíblico, nada a ninguém) ao país. Mas o país pagou-lhe de
volta com juros, deu-lhe estatuto, motorista, carros, poder imenso e, até, uma
Fundação! E até lhe permite diatribes como esta de se dar ao luxo de faltar à
comemoração do dia que lhe trouxe o paraíso. A Mário Soares até lhe é
permitido, com louvores vários, morder na mão que o sustenta e ampara os seus
vícios de homem rico. Logo, o Dr. Mário Soares deve ao País o respeito que,
pelos vistos, não é o seu forte.
Recuso-me a
comentar aqui outros estádios do seu percurso político, menos abonatórios. Não
gosto é de ler comentários como os do fórum do Expresso sobre Ricardo Costa
quando disse que esta ausência era "Um dos erros
políticos mais graves de Mário Soares". Alguém, entre muitos outros, que
pratica ou metaforicamente insultaram o jornalista, escreveu, então, que “O Dr.
Mario Soares tem toda a legitimidade e direito de comparecer onde muito bem
quer e onde se sente bem, é a ele que voçe deve o fato de estar em liberdade de
imprensa e de opinião, é a ele que voçe deve toda a sua pompa trabalhista, é a
ele que voçe deve o fato de fazer comentários inuteis e inoportunos”
(transcrito sem edição…). Que me conste, quando Portugal acordou na alvorada de
Abril, ainda o Dr. Mário Soares estava fora do país, limitando-se a regressar
para herdar uma democracia de que haveria de servir-se ao longo destes 38 anos.
E, mesmo quando marchou contra os comunistas, ainda estou para saber se, não
tivesse sido o Almirante Pinheiro de Azevedo, a grande marcha teria vingado.
Como mais tarde, se não tivesse sido Ramalho Eanes, será que ainda tínhamos
democracia, mesmo com Mário Soares?!
É
conhecida alguma tentação para se reescrever a história no sentido de
salvaguardar a imagem de alguns senadores e branquear alguns dos seus actos
políticos mais controversos, transferindo a responsabilidade para outros. Mas,
se hoje estamos na mão da Europa e do seu dinheiro é porque vultos como Mário
Soares nos encaminharam para este pesadelo da soi disante Europa unida,
ou União Europeia. E foram alguns dos seus herdeiros – a quem deu cobertura –
que transformaram este país naquilo que ele hoje é, corrupto e decrépito, sem
honra na sua história e com um presente envenenado por uma casta de gente que
apenas se preparou para subir nas costas e na boa-vontade do povo,
aproveitando-se da sua ingenuidade e falta de memória (Ah! Foi Mário Soares que
o afirmou: o povo não tem memória…).
Sim, estou
revoltado! Trabalhei quase quarenta anos, participei na revolução (era oficial
miliciano aquando do golpe), obrigaram-me, em Moçambique, a participar numa
descolonização com a qual não concordava (não fugi como tantos outros “revolucionários”,
desses que faltam aos seus deveres institucionais, para o exílio, fiquei por
cá, aguentei a ditadura e os seus efeitos, lutei aqui pela liberdade apesar dos
perigos, não desrespeitei a minha bandeira), estudei a trabalhar para poder
subir na vida e poder ter uma aposentação digna, e o que me fizeram?!
Sim, estou
revoltado!
Sei que não
devia! Faz-me mal à hipertensão, à diabetes, às maleitas a cujo tratamento é cada
vez mais caro chegar. Por culpa de quem? Talvez minha por ter tentado ser um
cidadão!
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