quinta-feira, 13 de agosto de 2009

"Um rei assim"

Não sou indefectível de Saramago. Acho que se enganaram quando lhe outorgaram o Nobel. Para mim, antes dele, deveria ter ganho Cardoso Pires; depois dele, ou em vez dele, Lobo Antunes.

Claro que há quem discorde. Nada contra. Não tenho complexos de infalibilidade. Trata-se apenas de uma opinião como as outras. Só que minha!

Mas essa não coincidência, política e estética (também os restantes mencionados não comungam as mesmas ideias políticas que eu, mas não sou sectário), não me coíbe de trazer aqui um artigo de José Saramago, publicado ontem no Diário de Notícias, sob o título: "Um rei assim".

Faço-o apenas por vingança!

É que os monárquicos meteram-se comigo por causa do Sr. D. Duarte. Respondi á letra, não tugiram nem mugiram.

Sei que José Saramago não lê o meu blogue. Não escreveu, por isso, o artigo para defender a minha honra. Mas sinto-me de certa forma vingado por este artigo. Porque li o "Memorial do Convento", porque ri com os "traques" de Sua Alteza Real D. João V e adorei Blimunda. E Mafra, com o seu convento, faz parte do meu histórico militar, já que frequentei aí o primeiro e segundo ciclos do Curso de Oficiais Milicianos, com todo o cortejo de recordações que o serviço militar sempre deixa.

Os seguidores do Senhor D. Duarte não me responderam mais. Pois assoem-se lá a este lenço. Bordado a Prémio Nobel. Assoem-se, dobrem o lenço pelas pregas e coloquem-no nos vossos (nobres) bolsos reais. Fica-vos bem uma prosa destas.

Eis, então, o que escreveu José Saramago:


O rei assim é o sr. D. Duarte de Bragança, pessoa medianamente instruída graças aos preceptores que lhe puseram logo à nascença, mas que, não obstante, detesta a literatura em geral e o que escrevo em particular, primeiramente porque considera que no Memorial do Convento lhe insultei a família e em segundo lugar porque a dita obra é, de acordo com o seu requintado linguajar de pretendente ao trono, uma "grande merda". Não leu o livro, mas é evidente que o cheirou. Compreende-se, portanto, que, durante todos estes anos, eu não tenha incluído o sr. D. Duarte, de Bragança, note-se, na escolhida lista dos meus amigos políticos. Não me importo de levar uma bofetada de vez em quando, mas a virtude cristã de oferecer ao agressor a outra face é virtude que não cultivo. Tenho-me desforrado apreciando devidamente as qualidades de humorista involuntário que este neto do senhor D. João V manifesta sempre que tem de abrir a boca. Devo-lhe algumas das mais saborosas gargalhadas da minha vida.

Isso acabou, a monarquia foi restaurada e há que ter muito cuidado com as palavras, não vão aparecer por aí, redivivos, o intendente Pina Manique ou o inspector Rosa Casaco. Como que restaurada a monarquia? perguntarão os meus leitores, estupefactos. Sim senhor, restaurada, afirmou-o quem tem as melhores razões para dizê-lo, o próprio pretendente. Que já não é pretendente, uma vez que a monarquia acaba de ser-nos restituída pelo drapejar da bandeira azul e branca na varanda da Câmara Municipal de Lisboa. Os moços do 31 da Armada (assim os escaladores se designam a si mesmos) têm já o seu lugar assegurado na História de Portugal, ao lado da padeira de Aljubarrota de quem se desconfia que afinal não matou castelhano nenhum. Não é o caso de agora, A bandeira esteve lá durante alguma horas (haverá um monárquico infiltrado na Câmara para ter impedido a retirada imediata?), pretende-se averiguar quem foram os autores da façanha, e isto acabará como sempre, em comédia, em farsa, em chacota. O sr. D. Duarte não tem estaleca para exigir na praça pública, perante a população reunida, que lhe sejam entregues a coroa, o ceptro e o trono.

É pena que uma tão gloriosa acção vá acabar assim. Mas como, no fundo, sou uma pessoa cordata, amiga de ajudar o próximo, deixo aqui uma sugestão para o sr. D. Duarte de Bragança. Crie já uma equipa de futebol, uma equipa toda de jogadores monárquicos, treinador monárquico, massagista monárquico, todos monárquicos e, se possível, de sangue azul. Garanto-lhe que se chega a ganhar a liga, o país, este país que tão bem conhecemos se ajoelhará a seus pés.

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